Neurose
Dedo no gatilho, medo em ausência
Posso ver o brilho no tambor do meu Bulldog
Escolhi as melhores munições com paciência
Não terão piores dias que ouvir Balrogs
Drogue a mente com álcool e suas vertentes
Jogue fora que todos que bebem são doentes
Anestesia, a gente traz cores pra realidade
Sem anistia das dores que voltam sempre à tarde
A realidade é que eu fui inocente
Com o sonho adolescente de salvar o mundo
Mas ser militar é mais que ser combatente
É encarar as vaidades de políticos imundos
Ouço essas vozes, tomo doses, elas somem
Ouço ela falar que não sou mais seu homem
Tento olhar e agora ela está calada
Começo a questionar e ela fala: "Eu não falei nada"
Será que sou piada? Ouço agora sorrisos
Piso melado, sangue, sons de estampidos
Quero que confesse que tu tem amantes!
Ensurdecem meus ouvidos gritos agonizantes
Esfrego minha visão, vejo homens escondidos
Copo cheio, ilusão, premunição, perigo
"Cara, eu sou seu amigo, não faça essa merda"
É o Pedrão e eu com a mente lerda
"Marcone, acorda! Essa é sua família!"
Eu olho pro lado, procuro minha filha
Vejo a porta do quarto toda esburacada
Furo de tiro, chutes e com muita porrada
Outro surto que eu tive, não 'to livre, ele vive
Toda vez que eu descanso, não adianta que esquive
Toda vez ele revive, eu fico cego, perambulo
Não me entrego, mas carrego a dor de ficar nulo
Será que fiz essa merda e matei minha família?
Vou pro quarto seguindo de sangue a trilha
Ouço uma voz mandar eu ficar longe do quarto
Disse contar até cinco e já estava no quatro
Disparo de taser atinge meu sistema nervoso central
Tinha que ser treze pra abater esse animal
Mas a cena que vem, não me sinto bem
Novamente, o despertador traz a dor de volta do além
O ódio manipula, estimula o crápula
Na cúpula esdrúxula da bula de um Drácula
Sem fabula onírica dantesca de uma sátira
Estipula a data chula pra findar essa mácula
Pensamentos se afastam, sou nocivo pra família
Deram um basta, procuraram Porto Seguro, Bahia
Furos na porta, grades tortas, casa em luto
No culto, até pastores temeram os meus surtos
Na minha mente, tumultos, sonhos de conflitos
Com anjos e demônios, deuteronômios, reflito
Na guerra contra espíritos do mal e principados
Acordo me sentindo mal, machucado e ensanguentado
Vejo no jornal matinal a aparência
De um monstro que caça marginal e pego a referência
Do Opala, da balaclava que 'tava no porta-malas
E a fala de um repórter que teme minha bala
Será que eu tornei o que eu tanto combatia?
No momento que pensei que se alguém no portão batia
Já fiquei vivão, em euforia, mente em brasa
Será que ganhei na loteria e vieram na minha casa?
Pode entrar, deixa o portão aberto, empurra
Cansei de trocar nas vezes que estourei a fechadura
Assim me sinto bem, adrenalina é minha cura
Só era alguém da Cemig pra fazer a leitura
O cara murmura, sai voado, faz sinal da cruz
Que diabo que mora aí que nunca usa luz?
Mal sabe que seu peito 'tava perto de ter um furo
Pra que que eu vou usar luz se vejo melhor no escuro?
Dessa vez, eu juro que eu vou chegar em Porto Seguro
Vou de avião, pra no caminho não arrumar confusão
Não sei o quanto é ilusão, o quanto foi realidade
Minha imaginação quase nunca traz verdades
Marcone, tira suas mãos de mim, seu monstro!