José

Silvestre Kuhlmann

Jacó tinha doze filhos: Rubem, Simeão, Judá, Levi
Gade, Aser, José, Benjamim, Issacar, Zebulom, Dã, Naftali
(Naftalina?)

José era o mais querido, ganhou de seu pai uma túnica
Seus irmãos o invejavam: Quantas cores! Única!
Pra piorar, José contava seus sonhos
Risonhos pra ele, pros manos, tristonhos
Num deles, todos pegavam feixes
O molho de José ficava de pé
Os dos outros o rodeavam e se inclinavam

Isso aumentava nos irmãos a raiva e ciúme
Esse moleque não perde esse costume!
Você acha que vai sobre nós reinar?
Ah! Vamos é te pegar e surrar!
Ele teve outro sonho ainda: O sol (Jacó), a lua (Raquel)
E onze estrelas dos céus (por acaso os irmãos seus)
Se inclinavam diante de José
Seu pai o repreendeu: Vai com calma, Mané!
Se acha o cacique, o pajé? O rei da ralé?
Mas cheio de emoção guardava isso no coração

Um dia os irmãos cuidavam do gado
E Jacó mandou José, o folgado
Ir ver se os irmãos estavam bem
E José foi até Siquém
Ali eles não estavam, mas em Dotã
E os irmãos o viram: Lá vem o tantã!

Queriam matar o menino
Mas Rubem pensou em melhor destino
Os irmãos a túnica única tiraram
E num buraco o jogaram

Foi Judá que teve outra idéia
Vender José aos ismaelitas
Que iam pro Egito, numa caravana
Em seus camelos, levando coisas bonitas

Rubem viu a cova vazia e com os outros grita
Venderam José? Como voltarei a nosso pai?
Então pegaram a túnica única e a mancharam
No sangue de um cabrito que mataram
Levaram a Jacó que viu e chorou
Uma fera pegou José e o devorou! (ele pensou)

E José, moço bonito
Foi levado ao Egito
Quem o comprou foi Potifar, capitão
E vendo que tudo prosperava em sua mão
Entregou a José tudo o que tinha

Potifar tinha uma mulher bonitinha
Que gostou de José, e quis fazer coisa feia
Trair seu marido, no escondido, armou uma teia
Quando não tinha ninguém na casa
Pra José arrastou a asa, que disse: Vaza!
Seu marido me confiou tudo, menos a esposa
Não lhe faria isso, coisa horrorosa
Pecar contra ele e meu Senhor Deus
Melhor tirar de mim os olhos teus!

Mas ela agarrou José pela roupa e a tira
Fugiu pelado, coitado! Aí ela inventou a mentira
Disse ao marido: Ele quis de mim se aproveitar
E eu comecei a gritar e gritar, pra lhe assustar
E assustado ele fugiu sem a roupa
Potifar ficou com raiva! Quase lhe deu uma peia
E José foi parar na cadeia

E ali estava José, na prisão
Mas tudo prosperava em sua mão
E o carcereiro fez dele o chefe dos presos
E José superava os desprezos
Isso não nos deixa surpresos?

Lembra que José costumava ter sonhos?
Ele também os interpretava
Mesmo os sonhos estranhos e os medonhos
Ele ouvia e desvendava

Um dia foram presos o copeiro e o padeiro
Porque ofenderam o rei do Egito inteiro
E os dois, chefiados por José na prisão
Mostravam uma estranha perturbação

José perguntou: Por que esta tristeza?
(José tudo percebia com destreza!)
Eles disseram: Ao nosso sonho, nossa visão
Ninguém dá a interpretação

José lhes respondeu: Deus tudo desvenda!
O resto é lengalenga, é lenda
Contem-me! Por favor

E o copeiro contou com pavor
Saíam três galhos de uma parreira
De cada galho saia uma flor na beira
Que amadurecia e virava um cacho, um cachão
E eu espremia as uvas no copo do macho, o machão
O Faraó. E entregava o copo na sua mão

José falou que três galhos eram três dias
E neste tempo, terminariam suas agonias
O copeiro, assim como gostaria
Ao seu trabalho antigo voltaria, serviria o Faraó
E ao copeiro disse: Não me deixe só
Quando estiver bem, lembre-se de mim
Estou preso sem ter feito nada de ruim

E o padeiro, ouvindo a boa interpretação
Contou seu sonho, cheio de animação
Na minha cabeça tinham três cestos com pães
No mais alto ficavam os pães do Faraó
E vinham aves, e as comiam sem dó

José explicou que cada cesto era um dia
E em três dias, Faraó sua cabeça arrancaria
Num pau penduraria, e as aves, suas carnes comeriam
Realmente tudo isso aconteceu
Mas o copeiro-mor, ficando bem
De José se esqueceu

Dois anos se passaram, e José continuou na prisão
E agora quem teve um sonho estranho? Faraó
Eram sete vacas bonitas e gordas, feito um botijão
E outras sete feiosas, e magras de dar dó
As feiosas comiam as gordas na praia do rio
E sonhou outro sonho, que lhe deu arrepio
Numa planta brotaram sete espigas cheias e boas
Depois outras sete miúdas e queimadas pelo vento brotavam
E as magras e queimadas as boas e cheias devoravam

Ele ficou agoniado, e precisava da interpretação
Aí o copeiro-mor se lembrou, enfim, de José na prisão
E ao Faraó contou o sonho dele, do padeiro, e a conclusão
Aos mistérios, o Deus de José deu a explicação

Então Faraó mandou chamar José, e contou-lhe seus sonhos
Disse que em todo o Egito, nada diziam sábios, magos e adivinhos
José disse: Faraó, o sonho é um só, é o que Deus fará
No futuro próximo, o que certamente virá

Sete vacas bonitas e sete espigas em sua formosura
Dizem que haverá sete anos de fartura
E sete vacas feias e sete espigas queimadas
São sete anos de fome e de amargura
E aconselhou Faraó a guardar o mantimento nos bons anos
Pra nos anos ruins não sofrerem grandes danos

Disse Faraó: Neste homem habita o Espírito de Deus!
Vou colocar-te sobre todos os bens meus!
Só eu serei maior que tu, em meu trono
Do Egito, você será o senhor, o dono
E deu a José o anel do seu próprio dedinho
Um colar de ouro, roupas de fino linho
E pôs José num carro e lhe deu honra e dignidade
E José nos sete anos fartos, cuidou bem de cada cidade
E juntou muito trigo, como a areia do mar
Eram tantos mantimentos, que até parou de contar
E José teve um filho, deu-lhe o nome de Manassés
Que quer dizer: Esquecer. Esquecer o mal e o revés
Teve ainda outro lindo filho, que chamou de Efraim
Que significa: Na terra da minha aflição, Deus lembrou-se de mim

Então se acabou a fartura
E veio o tempo ruim
No Egito havia muito pão
Mas no resto do mundo, não

Jacó mandou seus filhos buscar mantimento
E dez dos onze foram. Benjamim ficou
Perder o caçula seria um tormento
José, ele pensava, morreu, pra meu lamento

Os irmãos de José chegaram lá e se inclinaram
Diante de quem? De José, mas não o reconheceram
Mas José, sim, e se lembrou do sonho antigo
De sol, lua, estrela e feixes que diante dele se ajoelhavam
José lhes disse, vocês não são povo amigo
São espiões, e eles lhe contaram sobre a família, o clã
Sobre o pai e o mais novo que ficaram em Canaã
E sobre um deles que já não existia
(Mas José existia, vivia!)

José de novo disse: Vocês todos são espias
E os colocou na prisão por três dias
Deixou preso mais tempo Simeão
E mandou os outros buscarem Benjamim, seu irmão
Se eles não voltassem, disse, cabeças rolarão
Então reconheceram que aquilo era um castigo
Pois viram José angustiado, e não lhe deram abrigo
Rubem se lembrou que queria tê-lo livrado
Mas eles não o ouviram, e o venderam, coitado

José não era egípcio e tudo entendia
De cada um de seus olhos uma lágrima saía
Então se retirou, e quando voltou, ordenou
Que enchessem os sacos de trigo
E devolvessem o pagamento

Seus irmãos, menos Simeão, voltaram
E ao seu pai Jacó, toda a história contaram
Jacó se lamentou: Sem José, sem Simeão
O que querem mais fazer a mim?
Levarem o meu querido Benjamim?
E vendo o dinheiro todo no saco
O coração bateu ainda mais fraco
Pensaram ser uma cilada
E que terminariam mortos pela espada

Mas Rubem ao seu pai prometeu
Que guardaria o caçula como se fosse filho seu
Jacó não queria de jeito nenhum
Mas quando acabou a comida, e ficaram em jejum
Vendo que não havia outra maneira
Judá disse ao pai, seria uma besteira
Morrermos todos de fome, sentados na cadeira
Serei o responsável pela vida de Benjamim
Se eu não o trouxer, a culpa cairá sobre mim

Então Jacó os enviou com presentes e muito dinheiro
E a Deus pediu: Traga de volta meu Benjamim inteiro
E Simeão são e salvo, este é meu alvo

Voltaram ao Egito com dinheiro em dobro e presentes
Quando José viu Benjamim, contente, mostrou seus dentes
E mandou seus servos prepararem um banquete
E levar todos a comer em seu próprio palacete

Eles com muito medo, pensando ser cilada
Contaram a história, muito bem contada
Dos sacos de dinheiro que vieram com o mantimento
Quando retornavam a casa, em cima de cada jumento

José disse: O dinheiro chegou até a mim, fiquem em paz
Foi Deus que quis enriquecer vocês, e fez aquilo, rapaz
Os irmãos se prostraram diante dele novamente
E entregaram a ele um belo presente

E jantaram com ele, e a porção de Benjamim era bem maior
E José ao vê-lo, comovido, saiu pra chorar em outro lugar
Interessante é que o lugar de todos na mesa
Foi organizado de acordo com a idade. Que surpresa!

Após comerem, se despediram e voltariam para o lar
Mas José preparou uma cilada para os pegar
De novo, com o mantimento, no saco pôs dinheirim
E seu copo de prata no saco de Benjamim

Quando estavam ainda perto, cada um em seu jumento
Um servo gritou a eles: Um momento!
Roubaram, do governador, o copo de prata
Ele fez o bem, e vocês, esta coisa chata?

Eles disseram: Não fizemos isso
Quem for achado com o copo, que morra
E nós todos iremos para a masmorra

A resposta foi: Não. Será preso só o ladrão
Os outros soltos. Só se quer o culpado
Mas no saco de Benjamim o copo foi achado
E rasgaram as vestes, voltando à cidade
E a José disseram a verdade

Nosso pai é velho, e Benjamim é o mais novo e querido
Seu irmão foi morto, e nosso pai ficou muito sentido
Se Benjamim não voltar, nosso pai ficará comovido
Morrerá triste, e ferido, por isso, a ele foi prometido
Que voltaria Benjamim em segurança e paz
E que mal nenhum aconteceria ao rapaz
Então faça assim, fico eu, Judá, em seu lugar, por escravo
E que os demais voltem ao nosso povo

Então o governador chorou e chorou
Sou José, irmão de vocês, ele falou!
Mas não fiquem tristes por me causarem tormento
Pois Deus aqui me colocou, para a todos dar livramento
Na fome, preservar a vida e o alimento
Apressem-se contar ao meu pai esta história
Que sou vivo, que me deram aqui honra e glória
E se lançou ao pescoço de Benjamim, e chorou
E Benjamim ao seu pescoço também se lançou
E a todos beijou e abraçou

E Faraó, sabendo de tudo isso que foi dito
Mandou os irmãos buscarem Jacó, e voltarem ao Egito
Eles foram com presentes e carros para trazer as pessoas
Roupas, pão, e tantas coisas boas
Quando contaram a Jacó que José vivia e governava
Ele quase desmaiou, porque não acreditava
Mas vendo os carros, enfim acreditou
E disse: Vive José e a ele vou
Preciso muito a ele ver
Antes de enfim, morrer

E José foi ao encontro de Jacó
E ao se verem, era um choro só
Mas choro de alegria, porque tinham gosto
Em olhar cada um para o outro rosto
E Faraó deu a Jacó e todo o seu povo
Muitas terras, e ali cresceram e se alegraram de novo

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