Raspa

Oswaldo Montenegro

raspa a mão na rua
e sente a dor da morte antiga
raspa a sola suja do sapato
é o fim do dia

raspa a mão na moça
e sente a coxa toda nua
nunca sua

raspa o coco da cabeça
e até que sua mente cresça
vá pra casa festejar

raspa o pó de arroz
da sua amante preferida
raspa cuidadoso o bafo
podre da bebida

raspa a barba e pensa
que o patrão vai dar aumento
pelo bom atendimento

pela sua garantia
pelo pouco pensamento
e mais um dia

raspa o que lhe assusta
em minha boca e lhe agride
raspa essa poeira do meu braço
e vê se enxerga

a força que explode
no meu sangue me alucina
me enraivece
e antes que o amor termine

raspa a lama do meu rosto sujo
pra olhar de perto
a minha cara feia

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