Müller no Hotel Hessischer Hof
No restaurante do hotel a inocência dos ricos
O olhar fleumático sobre a fome no mundo
O meu lugar é entre as cadeiras O meu sonho
Cortar a garganta engelhada da viúva na mesa vizinha
Com a faca do criado
Que lhe trincha o lombo de cordeiro Eu
Também não cortarei esta garganta
Durante a minha vida não farei nada de semelhante
Não sou Jesus Quem traz o gládio Eu
Sonho com gládios Sabendo que mais tempo do que eu
Durará a exploração em que tomo parte
Mais tempo do que eu a fome que mе alimenta
O terror da violência é a sua ceguеira
E os poetas sei-o mentem em demasia
Villon pôde ainda abrir as goelas
Contra a nobreza e o clero não tinha nem cadeira nem cama
E conhecia as prisões por dentro
Brecht enviou Ruth Berlau a Espanha e escreveu
Na Dinamarca AS ESPINGARDAS DA MÃE CARRAR
Gorki enquanto circulava por Moscovo puxado por dois cavalos
Odiava a pobreza PORQUE ELA HUMILHA Porquê
Apenas os pobres Maiakovski já se tinha
Condenado ao silêncio com o seu revólver
As mentiras dos poetas estão gastas
Pelos horrores do século Nos balcões do Banco Mundial
O sangue seco tem o cheiro a cosmético frio
O vagabundo a dormir frente ao ESSO SNACK & SHOP
Contradiz o lirismo da revolução
Eu passo de táxi Posso
Permitir-me Benn pode falar disso à vontade Ele não
Ganhou dinheiro com os seus poemas e teria
Esticado o pernil mesmo sem as dermatoses e as doenças venéreas
Na noite do hotel o meu palco
Não está mais aberto Os textos
Vêm sem rima a língua recusa o verso branco
Frente ao espelho quebram-se as máscaras Nenhum
Comediante me tira o texto Eu sou o drama
MÜLLER NÃO ÉS UM OBJECTO POÉTICO
ESCREVE PROSA A minha vergonha precisa do meu poema